Monday, August 13, 2007

Incríveis descobertas


Nunca fui muito de conversar com meu pai. Sei lá, nunca tivemos muito papo. Ele mandava e eu escolhia obedecer ou não. E obedecendo/desobedecendo, eu fui formando minha personalidade até os 22 anos, quando saí de casa. Nesses 11 anos que se passaram (aliás, hoje completo 11 anos em São Paulo!), meus pais se separaram, eu fui para a Europa duas vezes, casei e me separei e minha filha foi morar longe e nunca eu e ele paramos para conversar.


Tinha enorme curiosidade pelo período que ele havia morado em Salvador, pois sabia pouquíssima coisa. Sabia apenas que ele havia morado com o tio/padrinho dele e que tinha trabalhado num bar.


Bem, esse era o meu nível de informação. Que bom repórter eu sou...


Ontem, saímos para almoçar, batemos a cara numa fila enorme no primeiro restaurante e o desejo de ambos era peixes ou frutos do mar. Fomos ao restaurante em que ele sempre come no Boqueirão (que eu não gosto) e eu já esperava decepção... Mas além de comida excelente, descobri um monte de coisas sobre o velho Genésio... até porque tínhamos que matar o tempo de alguma forma enquanto o rango não chegava.


Meu pai saiu da casa dos pais (“o sítio não dava nada”) pela mão de sua mãe, que pediu ajuda ao tio Miguel, que o recebeu de braços abertos em Salvador e lhe arrumou emprego no bar de um camarada dele, cujo nome é bem legal, mas eu não guardei... (Vivi, eu sei, da próxima vez eu levo um bloquinho...) Meu pai tinha só 13 anos e o bar ficava num bairro (talvez) chamado Cidade Nova.


Putz, imagina, tudo bem que as famílias nordestinas não são mega-amorosas, mas imagina a minha avó... imagina a tristeza dela, soltando um filho no mundo com apenas treze anos. E lá meu pai chegou em Salvador, em 1958, pouco antes de completar 14 anos e ficou até 1967, quando voltou para o sítio do meu vô, advinhem, que continuava “dando nada”, tanto que ele foi trabalhar num estábulo ... E lá em Salvador meu pai pulou Carnaval (não consigo acreditar, nem pensar nisso!!!), frequentava as boates, bebia, zoava, cresceu longe dos pais...


O espírito aventureiro permaneceu por mais um tempo e, em 1967, ele mesmo decidiu e pediu no mesmo ano para vazar. Vovó, mais uma vez, pediu para a enteada que morava em Santos (minha madrinha), que desse uma forcinha para o meu pai e lá ele vive até hoje, isso faz 40 anos. Ele começou como faxineiro e trabalhou no mesmíssimo prédio, aposentou-se como zelador e lá continuou trabalhando até 2005.


Foi nesse prédio, a dois quarteirões da praia, que ele e minha mãe nos criaram com costumes burgueses (devido ao ambiente), mas em escola pública de bairro bom... Foi lá que fizemos nossas primeiras festas, que eu fiz os primeiros ensaios antes de minha primeira banda ter nome, foi lá que eu tomei um porre pela primeira vez e foi de lá que eu saí para São Paulo e não voltei mais, a não ser nas férias, feriados, para a pequena Santos.


E ontem fazia o tipo de tempo que mais gosto na praia. Céu cinza, vento frio, úmido, com o mar mexido, sem chuva... tempo que geralmente dá lá de maio a agosto, antes do sol e as flores ressurgirem em setembro. Era com esse tempo que eu gostava de sair para caminhar pela praia e pensar no amanhã, pensar versos novos, namorar, olhar os prédios tortos, o mar batendo na calçada.


Ontem quando eu caminhava e fotografava, vivia o presente, mas o passado estava junto (as demos das minhas bandas estão de volta e pela primeira vez eu tenho músicas da Nowhere em mídia digital) e vivia o futuro também, pois não conseguia parar de pensar em seus olhos verdes...


Para fechar, versos de um garoto cheio de sonhos, escritos um ano e pouquinho antes de eu deixar a praia para trás...


“My time has come/ I´m leaving tonight/ The future I´ve had hoped/ So much for/ Now is reality / I´m leaving tonight/ The past I´ve had hidden/ now is a lie...”


Wednesday, August 08, 2007

Sórdidos, mas comuns

A primeira coisa que me agradou ao chegar no Teatro Popular do Sesi com minha amiga foi perceber que estavam tocando o Exile On Main Street, dos Rolling Stones, em seqüência. Pensei: desse palco só poderá vir coisa boa.


Não sei se a trilha antes do início do espetáculo “A Educação Sentimental do Vampiro”, baseado em 40 textos do escritor Dalton Trevisan, o “vampiro de Curitiba”, foi escolhida por Felipe Hirsch ou por alguém de sua Sutil Companhia de Teatro, mas só poderia ser, pois tinha tudo a ver. Fora que imagino que Hirsch e sua trupe fiel, que inclui o incrível Guilherme Weber, adoram música_quem viu a belíssima adaptação que fizeram de “Alta Fidelidade”, de Nick Hornby, que ficou bem melhor que a de Stephen Frears para o cinema, sabe disso.


Stones tem tudo a ver com o mundo sórdido, mas comum de Trevisan. Sórdido, porque as histórias de submundo que ele conta revelam o pior lado do homem e da mulher, em todo o seu egoísmo, tristeza, ansiedade, devassidão... O mundo do autor, entretanto, é comum também, pois todos nós, mesmo os mais inocentezinhos, em algum momento, sentiram aquele gostinho de fel no cantinho da boca e se lambuzaram.


Fora que eu lembrei de várias histórias da minha vida assistindo situações narradas por Trevisan e drmatizadas por Hirsch na peça, mas isso renderia até outro texto.


A conclusão que se chega ao fim da peça de Hirsch é que não há salvação para ninguém, que não adianta buscar nada no céu, que não adianta recorrer a uma instância superior, enquanto não há nada em você que diga que vale a pena mudar. Na moral torta de hoje, se não faz mal (a ninguém), que mal tem? Não é verdade? Só não devemos ter dramas de consciência, arrependimentos. Na busca do prazer e do melhor para nossas vidas, só temos uma responsabilidade: que nosso prazer não machuque o outro.


Ao fim da peça, seguindo a ordem das músicas de Exile On Main Street que tocavam, chegou a vez de Happy, dos Stones, que começou logo depois de fechadas as cortinas vermelhas... “I Need A Love To Keep Me Happy”, cantam Keith Richards e Mick Jagger, narrando a história de um jovem que “nunca quis ser como papai/ trabalhando para o chefe dia e noite”.


E se queremos sair dessa vida de opressão, buscamos o prazer: seja um show, umas cervejas, uma baladinha, um abraço dos amigos, montar uma banda, dar beijos gostosos na boca da mais nova garota mais linda do mundo... Só sei que hoje estou extremamente cansado, depois do fantástico dia de ontem, mas serei o homem mais feliz do mundo até sexta-feira, porque até lá eu tenho um love to keep me happy. Pelo menos até lá.